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Os Artigos
Abril


Article #29
30-04-2020

Preparing for a Return to Work

Mobirise

Agostinho Abrunhosa

Agostinho Abrunhosa é Professor de Operações, Tecnologia e Inovação da AESE Business School.

Após semanas recolhidos, começamos a pensar em como será voltar, como nos adaptar e organizar para conviver com o vírus evitando estragos maiores. O artigo Agile C-Suite da HBR de maio-junho, ajuda-nos ao abordar o papel que os líderes de topo desempenham na criação de empresas ágeis, empresas que prosperam numa era de mudanças aceleradas e ruturas radicais.

Uma liderança agile[1] exige que os dirigentes criem um sistema cuidadosamente equilibrado que ofereça estabilidade e agilidade - um sistema que garanta a eficiência e promova a inovação, juntando-as sem as destruir. 

O exemplo de Brian Johnson mostra-nos a preocupação deste em não transformar os seus ativos de gestão, a eficiência, o fine tuning da supply-chain, em fardos que bloqueiem a inovação. Ao mesmo tempo vê surgir pequenos e ágeis concorrentes que o atacam como “piranhas”. 

O artigo conta-nos também como Henk Becker, Presidente da Bosch Power Tools, conduziu com sucesso a agile transformation da divisão a partir de 2016 como parte de uma iniciativa mais ampla. Fala-nos da sua experiência sobre como funcionam as equipas agile e como os executivos de topo devem adotar princípios agile para criarem uma empresa ágil. À medida que as equipas alteravam a sua forma de trabalhar também Henke mudou. Começou por implementar uma cultura de feedback e concentrar-se no potencial das pessoas e da organização. Os primeiros feedbacks que recebeu foram: "fez-se clique no meu cérebro e no meu coração". Viu que tinha de mudar a sua atitude e comportamento. 

Em tempos não convencionais, uma abordagem não convencional da gestão será fundamental para superar a crise e os concorrentes. 

[1] Inspirada na metodologia agile, oriunda do desenvolvimento de software, e cada vez mais vista como forma de aumentar a agilidade dos negócios e organizações.

Mobirise

Article #28
29-04-2020

COVID-19 e a transformação da Globalização

Mobirise

Adrián Caldart

Presidente do Conselho Académico da AESE e Professor da AESE e do IESE Business School.

Uma das consequências económicas mais claras associadas à atual pandemia é a evidência de que as complexas cadeias de abastecimento internacionais podem ser muito frágeis perante uma situação deste tipo.

Muitas empresas europeias tiveram ou têm sérias dificuldades para continuar os seus processos produtivos, quer por falta de matérias-primas ou produtos semifaturados chave de origem asiática para os quais não existem, ou existem de modo muito limitado, alternativas de fornecimento geograficamente próximas. Este risco já se estava a perceber como resultado do impacto da guerra comercial entre os Estados Unidos e a China, mas o Covid-19 converteu um problema embrionário numa realidade com consequências graves e imediatas. 

Esta situação está a criar em várias indústrias um debate entre “eficiência vs. resiliência” nas decisões de configuração da cadeia de valor. A eficiência justifica a divisão internacional do trabalho e a alta interdependência económica entre os países. A resiliência, pelo contrário, chama a robustecer a autossuficiência dos projetos industriais, pagando um preço a nível de eficiência para reduzir riscos de disrupção. 

Este debate, que está só a começar, poderá levar a mudanças importantes no paradigma industrial europeu durante os próximos anos, sobretudo num cenário de políticas ativas da União Europeia destinadas a reconstruir as economias nacionais. 

Os artigos aqui incluídos tratam com lucidez o impacto do Covid-19 na globalização e permitem refletir estrategicamente sobre como poderiam evoluir alguns setores industriais europeus a médio prazo.

Mobirise
Mobirise

Article #27
28-04-2020

What customers need to hear from you during the covid crisis

Mobirise

Adolfo González

Adolfo González é Professor de Política Comercial e Marketing da AESE Business School e Diretor do PGL na AESE Porto.

Qual é a atitude de marketing adequada por parte das marcas nesta crise do COVID?

No final de março, durante uma semana, a Edelman, uma empresa global de comunicação, conduziu um inquérito junto de 12 000 consumidores em 12 países (Brasil, África do Sul, Itália, França, UK, Alemanha, Coreia do Sul, Canadá, China, USA Japão e Índia), para compreender como estão os consumidores a responder ao marketing das marcas durante a crise e deixar algumas indicações para ação por parte dos CMO (Chief Marketing Officers). 

Um resumo do estudo pode ser obtido através deste link >> O estudo deu origem a um artigo de que é coautora Jill Avery, Professora na Harvard Business School. 

É interessante sublinhar um conjunto de aspetos revelados pelo estudo: 

· Os consumidores consideram que as marcas que utilizam são parceiros fiáveis e esperam que as mesmas comuniquem acerca da crise e da forma como a crise as está a afetar, aos seus colaboradores, clientes e produtos e serviços que disponibilizam 

· Devido ao facto de serem plataformas poderosas e impactarem muitas pessoas, os clientes esperam que as marcas se assumam como parceiras do Governo dos países e ajudem a mobilizar os consumidores (por exemplo no sentido de utilizar meios de proteção individual ou a adotarem comportamentos que mitiguem os riscos resultantes da pandemia). 

A este respeito, 55% dos inquiridos acredita que as marcas poderão responde mais rapidamente do que os Governos dos seus países, em temas desta natureza. 

· Os clientes esperam que as marcas façam o que for adequado e necessário pelos seus colaboradores, fornecedores clientes e pela sociedade em geral, sem olharem aos custos daí decorrentes para as mesmas. O estudo revelou que 90% dos inquiridos acham que as marcas devem ocorrer em “prejuízos significativos” para agirem desta forma. 

Os clientes referem que estar disponíveis para deixar de utilizar marcas que não se comportem desta maneira, e para procurar influenciar outros a fazê-lo também. 

Como entendem os clientes que as marcas podem ajudar durante esta crise? Há pistas concretas, como por exemplo: 

· Educar os seus clientes, através do uso da influência da marca junto dos seus consumidores (criando publicidade para televisão sobre a forma de lavar corretamente as mãos, por exemplo) 

· Oferecer produtos ou comercializá-los a baixo preço 

· Produzir artigos necessários ao combate à COVID (máscaras e luvas, por exemplo) 

Por último o artigo refere o cuidado que é necessário ter no storytelling das marcas, evitando o humor desapropriado ou, de forma inadvertida, parecer que estão a retirar da crise alguma vantagem para si próprias. 

O artigo refere-se à pandemia por que estamos a passar. Não temos, todavia por que não encontrar aplicabilidade destas ideias em outras situações de crise ou de grande disrupção, até porque esta não será certamente a última por que passaremos. 

Mobirise

Article #26
27-04-2020

Negotiation for Crisis Management, uma introdução ao vídeo da aula do Prof. Kandarp Mehta

Mobirise

Pedro Nuno Ferreira

Pedro Nuno Ferreira é Professor de Política Comercial e Marketing da AESE Business School.

O Professor do IESE Kandarp Mehta deu, há uns dias, uma aula online da qual gravou um interessantíssimo vídeo sobre a negociação para a gestão de crise no cotexto do COVID19.

O que é uma negociação? Quais as habilidades de uma boa negociação? A importância do processo numa negociação, a confiança, a empatia, o controlo das emoções próprias e como lidar com as emoções dos outros, o objetivo mínimo e o potencial, o perceber o outro, a paciência, a colaboração, o reformular, a escuta ativa e o inesperado papel da esperança são tratados de forma muito prática nesta aula. 

A necessidade de continuar a dialogar e o conceito de “in a crisis keep talking” associado à necessidade de uma adequada preparação da negociação e do processo negocial, de mostrar à outra parte que juntos podem alcançar um resultado melhor e as diferenças numa negociação online e como a aproximar da presencial, são vistos de uma forma concreta para que negociação seja bem-sucedida. 

O papel do negociador, que também tem de ser um mediador, e a necessidade de, neste tempo, se focar no longo prazo e aceitar o mínimo viável, são luzes para quem tem de negociar em situações de crise. 

Por fim, dois conceitos que me são caros, “nunca se deve bater com a porta com muita força porque nunca se sabe quando é que temos de a voltar a abrir” e o inesperado “esperança traz esperança” porque “negociar com esperança traz um resultado melhor”. 

Por tudo isto vale a pena assistir, mais do que uma vez, ao vídeo da aula do Prof. Kandarp Mehta, ficaremos seguramente mais aptos a negociar em tempos de gestão e crise. 


Article #25
24-04-2020

The Moonshot Effect: Disrupting Business as Usual

Mobirise

Agostinho Abrunhosa

Agostinho Abrunhosa é Professor de Operações, Tecnologia e Inovação da AESE Business School.

The Moonshot Effect: Disrupting Business as Usual

Negócios que se reinventaram, novas ofertas criadas em dias, novos mercados e segmentos alvo, novos fornecedores, etc. são hoje necessidades incontornáveis pois os tempos exigem projetos “moonshot” (projetos ambiciosos realizados sob prazos extremamente apertados, com o objetivo de alcançar ou desenvolver algo único) de alta velocidade. 

Este livro recorda-me o discurso de John Kennedy We choose to go to the moon-speech que uso nas aulas de gestão de projetos. O desafio não era apenas ir onde mais nenhum humano tinha ido, mas potenciar o desejo de superação, realizar algo extraordinário e que parecia quase impossível de alcançar. Visão, foco no objetivo e a necessidade de motivar são ideias fortes nesse vídeo. 

Estas ideias não ajudam apenas nações a chegar à lua. Podem ser potenciadas por qualquer empresa que esteja disposta fazer projetos “moonshot”, cada vez mais necessários. O problema é que muitas empresas não se envolviam neste tipo de projetos. 

A maioria dos projetos estava focada no status quo e seguiam em velocidade cruzeiro até que algo os forçava a sair da zona de conforto. Esperar por uma razão para tirar a sua empresa da zona de conforto é uma estratégia perigosa nesta era de cisnes negros[1] em que é de esperar o inesperado. Enquanto o Myspace e o Blockbuster descansavam sobre os louros, a Netflix e o Facebook desenvolviam serviços competitivos mais rápidos e apreciados. 

Aumentar a competitividade e colocar o trabalho em equipa num novo nível são alguns dos motivos pelos quais os autores de "The Moonshot Effect" (Wynnefield Business Press, 2016) querem que os leitores saiam da zona de conforto. Mesmo que não produzam foguetões, podem criar produtos ou serviços que os levem a novos patamares de resiliência e sustentabilidade.

Bons projetos e boa leitura!


[1] Um "cisne negro" é um acontecimento (aparentemente) altamente improvável (geralmente com um enorme impacto), imprevisível, mas que, se estivéssemos atentos aos sinais (ou os estudarmos a posteriori) conseguiríamos prever a sua ocorrência (ou explicar, se a posteriori). Conceito do livro O Cisne Negro. O impacto do altamente improvável de Nassim Nicholas Taleb.

Mobirise

Article #24
23-04-2020

Um olhar sobre o Setor de Economia Social

Mobirise

Cátia Sá Guerreiro

Cátia Sá Guerreiro é Professora da AESE na área de Fator Humano na Organização e Diretora do GOS.

Preâmbulo
30 de Janeiro de 2020 
Cape Town, 22h 

Depois de um agradável jantar, estamos de volta ao confortável hotel em CapeTown, bem junto a Table Mountain. Um grupo simpático que prolongou um dia de trabalho intenso num jantar cheio de charme num bistrô onde os estilos europeu e africano se fundem numa simbiose quase perfeita. Dois brasileiros, um húngaro, dois sul-africanos e dois portugueses. O grupo, a empatia, as diferenças entre nós e os motivos que nos unem convidam a mais dois dedos de conversa antes do merecido descanso. O que motivou o encontro de um grupo tão heterogéneo, formado por gente de 4 países tão diferentes, por 3 senhoras e 4 senhores de idades compreendidas entre os 40 e os 69 anos? O desafio de discutir a formação e recursos humanos da saúde a nível global, sob a alçada da Organização Mundial de Saúde (OMS), com a ambição já antiga, e sempre legítima, de proporcionar a todos, no nosso tão pequeno e grande mundo, equidade no acesso a cuidados de saúde. 

Confortavelmente sentados no lounge do hotel, foi impossível não olhar a televisão. Todos os olhares para ela se voltavam. A China. Um hospital enorme, de campanha, acabara de ser construído. Uma epidemia. Um vírus. Centenas de infetados. Prevalência crescente. Mortalidade impactante. Sendo nós elementos de uma equipa a trabalhar com a OMS foi impossível não nos determos no tema. Que coisa seria aquela? Uma loucura da China… a OMS manifestava preocupação… Era lá longe… coisa estranha… lá longe, bem ao estilo e dimensão da China…


Tempo de incerteza – um olhar sobre o Setor de Economia Social

 A 3 de Fevereiro teve início em Lisboa, na AESE, o 19º GOS, Programa de Gestão de Organizações Sociais. Um total de 47 participantes, representando 34 entidades do Setor de Economia Social em Portugal, propunha-se a vir semanalmente às instalações da Business School para receber formação com o intuito de aprofundar boas práticas de gestão e liderança. Resultando de uma parceria entre a ENTRAJUDA, CNIS, Fundação Millenium bcp e AESE, o GOS decorre ininterruptamente há 12 anos, atualmente com edições em Lisboa e no Porto. 

Para 2020, num setor fortemente marcado pela mudança de paradigma que tem vivido nos últimos anos, surgia como prioridade o diálogo intersectorial, no sentido da garantia da sustentabilidade das organizações, numa perspetiva win-win. Porque não aproximar a forma de gerir as organizações sociais do paradigma de gestão do setor lucrativo, sem desvirtuar a missão das entidades e do setor? Como promover boas iniciativas em responsabilidade social nas empresas? Como incentivar a inovação social? Tínhamos tudo isto na agenda. Já havíamos começado neste desafio do diálogo intersectorial e já temos boas histórias para contar de Alumnis AESE que, com o seu saber, apoiaram organizações “antigas alunas” GOS. Tínhamos planos para ampliar estas iniciativas. E gente de todos os setores com vontade de fazer acontecer a diferença. Alunos e alunas desta instituição, stakeholderes com interesses comuns e missões distintas. Num mesmo mundo, numa perspetiva de convergência. Queríamos desafiar os caminhos da sustentabilidade. Inovar nas práticas e nas abordagens. Provocar para redimensionar. 

Veio o vírus. E tudo mudou…

Onde estão as prioridades? As ideias… Deixaram de existir? Não… terão de ser revistas… 

O GOS não deixou de ter aulas. Como Diretora do Programa, testemunho a determinação daqueles que, estando na linha da frente da luta contra os efeitos desta pandemia, param uma tarde por semana para ter aulas online. Param para estar uns com os outros. Param para criar rede, de forma espontânea. Entreajudam-se. Fazem valer recursos que já existem. Partilham ideias, bens, serviços, conhecimento. Ouvem-se. Sabem que existem e não estão sós. Fazem-se companhia. Só tenho a agradecer por me deixarem fazer parte deste grupo. Por me “obrigarem” a planear aulas, a ter resposta, a fazer perguntas. Eles inquietam-me e pedem que nós, na AESE, os ajudemos a não baixar os braços. 

Ao longo destas semanas temos ouvido e visto muitos e merecidos elogios aos profissionais de saúde e segurança que têm trabalhado incansavelmente, e tantas vezes colocando-se em risco, por Portugal, pelas nossas gentes. Hoje, aqui, tenho de estender estes elogios, tenho de dizer bem alto um obrigada, a todas e a todos aqueles que, nas entidades do setor de economia social, se ocupam da população em risco. Funcionários de lares, de instituições de acolhimento de crianças e jovens, de associações de doentes, de tantas entidades que dão respostas a necessidades de primeira linha a pessoas que são consideradas vulneráveis e de risco neste cenário de pandemia. O setor do silêncio, que tantas vezes pouca projeção dá ao que faz mas que está sempre presente. 

Que desafios enfrentam estas entidades?

Cuidam dos outros todos os dias, 24 horas por dia, sete dias da semana, feriados, fins-de-semana, épocas especiais. São o rosto de quem acalma o outro, de quem cuida, esquecendo-se de si e dos seus medos. São eles quem acalma a saudade das famílias separadas. São, tantas vezes, a mão que ampara o último adeus.(1) 

Enfrentam os desafios da gestão de recursos humanos neste cenário conturbado, da assistência às famílias (e também às suas!), dos horários onde as horas crescem e o tempo de repouso diminui. 

Enfrentam desafios de trabalho em articulação com as entidades do Estado, com as orientações nacionais, e têm estado na linha da frente deste desafio de harmonia em prol do bem comum. Para lá do que ouvimos, das queixas que surgem, dos relatos de dificuldades, fica a certeza de esforços de todas as partes por chegar a bom porto na implementação de respostas eficazes e eficientes à pandemia. 

Enfrentam ainda desafios de sustentabilidade que, certamente, se farão sentir para lá desta fase, quando a prevalência da doença diminuir e os ritmos regressarem à esperada normalidade. Muitas organizações sociais não têm reservas financeiras que permitam aguentar o impacto de um evento catastrófico, o que significa que meses de redução de financiamento poderão conduzir ao desemprego de muitas pessoas e ao colapso de algumas organizações (2). 

Enfrentam desafios na forma como prestam serviços. Como não desvirtuar a missão e repensar as novas formas de a efetivar? Planeamento. Tomada de decisão. Inovação. Estratégias nem sempre fáceis de assumir neste setor. 

Enfrentam ainda o grande tema da Saúde Mental. Que impacto terá esta situação pandémica na nossa forma de viver em sociedade e na nossa saúde mental? O isolamento e seus efeitos. Os idosos sozinhos. Os doentes com pouca companhia. Que vai na mente das pessoas? Dos utentes e também na das suas famílias? E dos profissionais, há semanas em situação de stress? 

Como encarar estes desafios?

São aqui muito válidas as 7 Lessons for Leading in Crisis descritas por Bill George (3). Sem me deter na sua enumeração e descrição, sublinho que este autor faz duas afirmações no mínimo úteis às entidades deste setor nesta fase da sua existência. Em primeiro lugar, Crises offer rare opportunities to make major changes in an organization because they lessen the resistance that exists in good times. Olhar esta crise como uma oportunidade para fomentar a resiliência. E a flexibilidade também. Tanto para aprender ou simplesmente para ir buscar ao mais profundo de cada funcionário, de cada entidade. E aos líderes o desafio é também grande: See crisis as a chance to develop and enhance your leadership skills. Sim, para os responsáveis das entidades do setor social esta pode ser uma oportunidade para desenvolver ou aprofundar competências de liderança que impactem no presente e no futuro das suas organizações. 

Tal como nos outros setores de atividade, também neste as crises, os fracassos e os problemas são parte integrante da vida das organizações. Cabe aos líderes enfrentar essas realidades com tenacidade, coragem, integridade e espírito de aprendizagem com os erros – e não negá-las ou procurar bodes expiatórios (4). 

E àqueles que não são deste setor podemos também lançar desafios no sentido do apoio à economia social. Que posso eu fazer? Que pode a minha empresa realizar? Em primeiro lugar, a um nível amplo, urge considerar que os Estados não serão a solução para a sustentabilidade destas entidades, pois estarão assoberbados, a desenhar respostas que mantenham a pandemia controlada, a dar suporte ao sistema de saúde, e a lutar por uma vacina que consiga fazer a normalidade regressar (2). Contribuirão mas não estará neles a garantia da sustentabilidade. A mesma fonte refere ser urgente que os grandes financiadores privados mundiais não esqueçam as organizações sociais e de suporte à comunidade - que os muitos fundos acrescidos necessários para o combate à COVID-19 não canibalizem o dinheiro dos financiamentos regulares às organizações. 

Isto tem de nos fazer pensar. Como cidadão e como empresas. Que vamos fazer? Valerá a pena repensar a forma como exercemos a nossa responsabilidade social? Afinal, se calhar voltamos ao tema que o GOS iria lançar para 2020 – os desafios da intersetoralidade! 

Epílogo
22 de Abril de 2020
Lisboa, 22h 

Em Portugal vivemos uma situação de confinamento social. Um vírus. Mais que uma epidemia, uma pandemia. Afinal não era uma loucura da China. Afinal não foi bem ao estilo e dimensão daquele país. É global. Estamos a trabalhar a partir de casa. As prioridades são outras. Os estilos de trabalho mudaram radicalmente. Inesperado. Inovador. 

Na Hungria, no Brasil, na África do Sul ou em Portugal enfrentam-se os mesmos desafios. Incrível como parece que estamos ainda mais próximos. Afinal não somos assim tão diferentes… Todos lutamos por conciliar as horas e os trabalhos dos nossos dias. Todos pensamos como adaptar os projetos que temos em mãos diante do cenário atual, numa visão que tentamos ser prospetiva, mas será sempre sem termo de comparação, pois nunca vivemos nada assim. 

Bebo um chá de roibos que trouxe de Cape Town e o meu pensamento recai sobre este setor pelo qual tenho tanto apreço e estima. Economia Social e Solidária. Setor não lucrativo. Terceiro Setor. Revejo os rostos daqueles que hoje estiveram online para mais uma aula sobre Inovação em Motivação Humana. Olhares mais cansados que há semanas. Mas ali presentes. Recordo os emails que tenho recebido, os relatos de episódios vividos na primeira pessoa. Gente que não se rende. Gente que se cansa mas não desiste. 

Será uma oportunidade, sem dúvida. Uma luta, já o é. Emergirão os bons líderes. Emergirão os que inspiram. Os que deixam rasto para lá das agruras do tempo presente. Os que sabem contar histórias com cor no cinzento dos dias. É a tempestade que consagra os bons marinheiros. São esses que emergirão. É desses que queremos ouvir a voz, mais alta que a dos lamentos do impacto do inesperado.

Cátia Sá Guerreiro

1. De alma e coração: OBRIGADO! [Internet]. [cited 2020 Apr 8]. Available from: http://www.solidariedade.pt/site/detalhe/13887
2. Pedra C. Quando o suporte colapsa [Internet]. VER. 2020 [cited 2020 Apr 20]. Available from: https://www.ver.pt/quando-o-suporte-colapsa/ 
3. George B. Seven lessons for leading in crisis. Jossey Bass; 2009. 
4. Rego A, Pina e Cunha M. Liderar em tempos de crise - reflexões para a ação. Católica Porto Business School; 2020.


Article #23
22-04-2020

Cushing e Pandemia, a tempestade perfeita na energia

Mobirise

Francisco Vieira 

Francisco Vieira é Professor de Operações, Tecnologia e Inovação e Diretor do AMEG da AESE Business School.

O sector energético não escapa certamente aos impactos duma pandemia que paralisou o mundo e lançou um espectro negro no futuro próximo das nações, das empresas e das famílias. Com muito poucas exceções, a generalidade dos sectores da atividade económica sente já os efeitos dos lockdowns e o tremendo desafio duma recuperação que se prevê longa, independentemente da forma da curva, entre tantas que a literatura nos tem brindado.

Este sector em particular – a Energia - tem, no entanto, dois aspetos especialmente sensíveis à natureza global da crise que agora começa: (i) a Energia é em si mesma um dos sectores mais globalizados da atividade económica; (ii) trata-se de um sector em pleno processo de transição para um mundo descarbonizado. Estas duas características parece potenciarem um efeito mais devastador que porventura noutras áreas da atividade económica. 

O sinal mais visível do coronavírus nos mercados globais da Energia é o folhetim Opec+, que se arrasta há quase 1 mês, e que resulta da queda a pique da procura mundial de petróleo num mundo paralisado pela pandemia. O Brent que negociava nos $70 em Janeiro, aproximou-se dos $20 no final de Março, muito pela recusa da Rússia em aceitar uma redução da produção, e da resposta da Arábia Saudita com uma guerra de preços suicida. E claro, não esquecer que em Novembro haverá eleições presidenciais nos EUA. Este afundamento dos preços do petróleo a que assistimos até ao passado Domingo (portanto ainda sem o crash de 2ª feira 20.04.2020) tem um primeiro conjunto de vítimas: as centenas de produtores independentes de Shale Oil no continente Norte Americano (Estados Unidos e Canadá), com balanços hiper alavancados, e com valores de break even bem acima dos $40. O Presidente Trump não tardou em desdobrar-se numa diplomacia económica com vista à necessidade imperiosa de reequilibrar os preços do petróleo com um corte do lado da oferta. É curioso constatar que bastantes dias após a obtenção desse acordo histórico entre a Opec e a Rússia (a 9 de Abril), a cotação do crude continuava sem evidenciar o esperado movimento de recuperação que seria de antecipar. Se bem que os valores de redução acordados neste último entendimento Opec+ não têm precedente na história recente, 10 milhões de barris por dia (num contexto de consumo pré-crise de 100 milhões barris por dia), o problema é que a contração mundial da procura nos próximos meses pode chegar aos 30 milhões de barris por dia, o que aliado ao nível record de stocks acumulados lança grandes incertezas sobre a eficácia do referido acordo. Vamos ver. 

Mas eis que há 2 dias o inédito surpreende tudo e todos: a cotação de referência do petróleo nos Estados Unidos – West Texas Intermediate - atinge valores negativos de $40. Num só dia, em poucas horas, o preço do WTI colapsa mais de $55. Já temos assistido a preços negativos da energia elétrica (não em Portugal porque a lei não permite), yields e taxas de juro negativas nos mercados de capitais, mas preços negativos numa commodity como o petróleo, é a primeira vez na história. Sem pretensões de “explicador” o facto merece, contudo, um esclarecimento. O que se passou há dois dias na New York Mercantile Exchange (CME), a praça bolsista onde se transaciona o WTI, é o resultado técnico de uma circunstância pontual num contexto global. Muitos dos contratos de futuros WTI (CME) estabelecem uma data limite ao dia 20 de cada mês, para as entregas físicas no mês seguinte. No passado dia 20 de Abril, os Traders perceberam por um lado a impossibilidade de vir a armazenar fisicamente o produto que prometeram comprar, e por outro o colapso da procura de petróleo nos Estados Unidos em Maio, o que gerou um movimento de pânico e a corrida talvez ao maior sell off a que os mercados de commodities alguma vez assistiram. Pagar para ver-se livre de uma mercadoria que o mercado não vai escoar e que não tem forma de armazenar-se. Aqui entra em cena a pequena localidade de Cushing, no Estado do Oklahoma (EUA), a maior encruzilhada de pipelines de todo o continente, com vastas instalações e terminais de armazenamento com uma capacidade de 72 milhões de barris. Este é o ponto de entrega consignado na maioria dos contratos futuros de WTI... e está com a capacidade quase esgotada. A cotação do WTI voltou no dia seguinte a terreno positivo, ainda que seja de prever uma enorme volatilidade dos preços nas próximas semanas, enquanto não se verificar o corte drástico nos níveis de produção. 

A quebra abrupta da atividade e do consumo registada no último mês na generalidade dos países da OCDE repercutiu-se igualmente nos mercados elétricos com os preços dos futuros a evidenciarem reduções muito significativas. É certo que por nossas casas a fatura da luz e do gás só pode crescer nestes meses de confinamento, com mais televisão, mais tempo de computador, maior utilização do forno, e menos mal que as temperaturas primaveris não têm obrigado a carregar no aquecimento. Tudo isto porventura compensado pela poupança forçada nos combustíveis. 

Mas do lado da produção, transporte e distribuição de energia elétrica as perspectivas não são famosas. Os investimentos intensivos que estas infraestruturas normalmente requerem são remunerados a prazo pela utilização que deles fazem os consumidores e o país. Há, pois, aqui uma lógica de negócio, não apenas de serviço público, que só pode ver-se agravada pela recessão que nos espreita.  

Não são tudo más notícias. Para um país como o nosso, altamente dependente das importações para fazer face ao nosso mix energético, a última coisa que precisaríamos para começar a repor a economia seria uma energia cara. Mas infelizmente não se prevê que os preços baixos estimulem por agora uma atividade produtiva com profundas marcas. 

Uma última nota relativa ao tema das alterações climáticas e aos impactos aparentemente positivos que a imobilização das principais economias está a ter nos níveis de emissões de gases com efeito de estufa. Evidentemente que ninguém advogará esta via para a resolução do problema da temperatura do planeta. Além disso, por muito limpos que se apresentem os céus da Europa ou os canais de Veneza, será sol de pouca dura. Vai demorar muitos meses, provavelmente anos, para voltarmos aos níveis de crescimento económico pré-crise, mas esse gap climático positivo será pouco expressivo, em vista do horizonte geracional desta agenda. O que me parece razoável prever será um abrandamento por parte das economias mais fragilizadas no processo da transição energética. As prioridades da recuperação económica e os impactos da crise no sector privado podem bem desviar a atenção duma agenda que “(não) pode esperar”.   

Será razoável pensar que a vida não vai permanecer exatamente igual à que tivemos até agora. Não é difícil antecipar que a aprendizagem a que nos tem sujeitado este regime de trabalho remoto, com a utilização de tecnologias deveras eficazes na produtividade de algumas equipas e empresas, irá provavelmente mudar o paradigma da mobilidade neste mundo globalizado. E quem já se apercebeu são com certeza as companhias de aviação, as poucas que irão emergir da crise, nacionalizadas ou com recursos extraordinários. 

O sector energético, movido pelas várias revoluções tecnológicas que têm proporcionado progresso à Humanidade, irá com certeza ter um papel determinante na recuperação do nosso tecido produtivo no pós-corona.


Article #22
21-04-2020

Refletir sobre o presente e construir o futuro

Mobirise

Pedro Alvito

Pedro Alvito é Professor na área de Política de Empresa e Diretor do Programa Construir o Futuro nas Empresas Familiares da AESE Business School.

Numa altura em que muito se fala no COVID e em que todos estamos envolvidos numa quarentena que nos força a novos hábitos, importa refletir sobre o presente e perceber que ensinamentos devemos levar para o futuro.

Talvez o mais importante fator a ter em linha de conta atualmente seja a comunicação com os diferentes agentes da empresa. Comunicação essa que deve ser verdadeira e permanente.

Refletir sobre o teletrabalho, os grandes escritórios em open space e a concentração industrial são questões que por motivos de segurança e backup nos levam a refletir sobre as opções tomadas no passado e uma forma nova de construir o futuro.


Article #21
20-04-2020

O líder em tempo de incerteza

Mobirise

José Fonseca Pires

Professor Coordenador da Área de Fator Humano na Organização e Diretor do PADIS da AESE Business School.

Os momentos de incerteza e de emergência não têm um padrão uniforme de líderes e de formas de liderar; se a calamidade vivida pela tripulação do Endurance durante a conquista da Antártida confirmou a liderança do líder natural (cfr. caso “Shackleton”), já a tragédia vivida pelos hóspedes do Taj Mahal Palace Hotel durante o ataque terrorista (cfr. caso “Terror no Taj Bombay”), viu emergir um líder inesperado: Hemant Oberoi, o chef de cozinha…

Mas perante situações de incerteza, podem identificar-se uma série de competências, atitudes e comportamentos que o líder deve ter e desenvolver, e que lhe permitem antecipar, compreender e estruturar um plano de acção. 

Em primeiro lugar, deve ser prudente; diante de situações complexas e incertas, deverá aconselhar-se e informar-se a partir de fontes credíveis e sensatas, por um lado; ponderar e analisar as várias alternativas; e, por último, tomar decisões, sem se deixar paralisar nem pelo medo nem pela hesitação. 

Perante a indeterminação que o rodeia, o líder deve estar focado, concentrado no relevante e importante, não se deixando derramar e perder em lamentações estéreis, ou em assuntos sobre os quais não tem controlo; agora não é a hora de alimentar quezílias, de julgar, de retirar confiança... é, sim, o momento para estar centrado, atento, vigilante… 

Nas crises, as organizações vibram no comprimento de onda dos seus líderes. Por isto, o líder deve ser o primeiro a assumir os objectivos propostos; lidera-se pelo exemplo; só assim se dá relevância aos objectivos, conferindo-se-lhes autenticidade e credibilidade. 

O líder não tem que ser um ser solitário… deve rodear-se de uma equipa que o ajude a enfrentar e a vencer a crise; deve rodear-se dos directores dos departamentos críticos, e procurar que na equipa existam também perfis com competências muito particulares: pessoas com visão sistémica; outros que sejam imaginativos e com visão “out of the box”; e elementos capazes de tomar decisões com base em informação incompleta. Para problemas complexos, equipas multidisciplinares, mas resolutivas. 

Numa crise, a implementação das decisões e o fluxo de informação são críticos. Por isto, é avisado libertar-se dos cargos intermédios de modo a encurtar distâncias entre decisão e respectiva implementação, assim como entre os problemas no terreno e o seu report aos órgãos decisores. 

Logo desde o início, deve-se falar com os colaboradores. E garantir que a comunicação é transmitida e bem entendida. Para isto, o princípio KISS (keep it simple and stupid) é muito adequado: usar frases curtas, objectivas, compreensíveis. Mas o conteúdo também é importante: devemos garantir que se entende quem está a cargo da situação, qual o plano de acção, que se conta com todos, que vamos resistir e vencer! 

Numa crise a comunicação deve ser uma paixão: querer manter todos informados! O silêncio é que não funciona, nunca. A comunicação deve ser dialógica, favorecendo o feedback. E ir actualizando a informação, com a regularidade mais adequada a cada caso. Porque, se não damos informação, crescem os boatos. E assim, além disso, ajudamos a evitar o “consumismo de informação”, o que na situação actual poderíamos chamar o “corona TV show”…. 

Numa situação de crise, os colaboradores devem estar ocupados; para isso, estabelecer um plano de acção, contando com todos, assinalando o papel de cada um; estabelecer rotinas de modo a que não haja perplexidades nem hesitações; evitar o ócio que conduz a desatar a imaginação, com tudo o que isto trás consigo, para o próprio, para os outros e para a organização…

Uma menção particular merecem os descontentes, os rebeldes, os desalinhados; o líder mantêm-nos perto de si, sob controlo; afastá-los poderá parecer “higiénico e salutar” mas equivale a permitir que “a bomba” rebente sem controlo, quando menos se espera, de forma totalmente inusitada… Aos descontentes, mantê-los sempre debaixo de olho…

O líder, por último, deve ser paciente. Há contrariedades, imprevistos, dor. Têm origem nas circunstâncias, nos outros, em nós próprios, que muitas vezes também não ajudamos… Além disto, prevê-se que esta batalha vai durar muito tempo… Por isso, o líder deve ser resistente, resiliente e paciente... Paciência é saber sofrer com classe! Sem queixas desnecessárias, sem desabafos inoportunos, sem comentários de desânimo, sem “victimismos”… e se possível, com bom humor.

Nesta crise do COVID-19 estamos numa guerra contra um inimigo invisível, mas bem real; tomemos inspiração em dois grandes líderes: em primeiro lugar no General estratega da 1ª guerra do Golfo, Norman Schwarzkopf, que nos aconselha a nunca abdicarmos do carácter, porque seria abdicar de nós mesmos… E no Prof. Raúl Dinis, anterior Presidente da AESE, que nos lembra que a confiança comanda tudo.

Especialmente em tempos de incerteza, a liderança que exercitamos deve suscitar confiança nos nossos colaboradores e nos clientes a quem servimos.

José Fonseca Pires


Article #20
17-04-2020

Novos hábitos e ensinamentos para o futuro

Mobirise

Luis Manuel Calleja

Professor de Política de Empresa na AESE Business School e Senior Lecturer of Strategic Management no IESE, no IEEM - Universidad de Montevideo, na Fundación Bravo Murillo de Las Palmas, no ISE de São Paulo, no ISEM de Madrid, no Instituto San Telmo de Sevilla, e na MDE de Abidjan (Costa de Marfim).

Luis Manuel Calleja é professor de Política de Empresa na AESE Business School e no IESE Business School, bem como em outras escolas de negócios parceiras da AESE, na América latina, Europa e África. Exerceu funções de Direcção-Geral e consultoria em empresas e organismos públicos de diversos países europeus.

Na AESE, o Prof. Calleja – que nos últimos meses tem estado retido em casa, por motivos de saúde – deu aulas memoráveis, pela sua experiência, sabedoria e capacidade de comunicação. Fê-lo durante muitos anos, nomeadamente no PADE - Programa de Alta Direcção de Empresas (o programa da AESE endereçado aos dirigentes de topo das organizações), entre outros. E esperamos que possa voltar a fazê-lo, em breve. 

Nesta mensagem-vídeo – dirigida expressamente aos Alumni da AESE –, o Prof. Calleja desenvolve a sua apresentação em torno de três pontos: as oportunidades de crescimento pessoal durante o confinamento forçado em que nos encontramos; os desafios do futuro post-pandemia (que não será igual ao passado); os riscos do presente, do ponto de vista da alta direcção. 

Vale a pena ver e escutar.

​Pedro Ferro, Diretor do PADE 


Article #19
16-04-2020

Adapting customer experience in the time of coronavirus

Mobirise

Ramiro Martins

Responsável Académico e Professor de Política Comercial e Marketing na AESE Business School.

Uma das principais etapas do desenho ou avaliação do Customer Experience é a identificação da chamada Jornada do Cliente. Esta etapa passa por descrever minuciosamente todas as interações de um cliente com uma organização - que podem ser constituídas por diferentes sub-jornadas ou jornadas paralelas - e avaliar cada uma com uma métrica objetiva, observada pela perspetiva do cliente.

Se alguma coisa o presente surto pandémico veio provocar, foi decerto uma profunda mudança dessas jornadas. Algumas empresas por estratégia própria, não consideravam sequer jornadas online. Outras, que ponderavam vir a integrar as jornadas online a breve trecho ou mesmo substituir as jornadas presenciais, mas que vinham adiando sucessivamente essa alteração, viram-se compulsivamente obrigadas a desenhá-las e implementá-las em tempo record. Outras que já tinham iniciado a sua implementação, verificaram um enorme crescimento e eventualmente observaram uma sobrecarga das mesmas, alterando naturalmente a avaliação dos clientes.

Dizer-se que o mundo não será igual ao que era depois da pandemia, já é um lugar comum. Mas onde essa mudança se manifesta desde já e de forma dramática é nas novas experiências que todos estamos a ter nas relações com as empresas que nos fornecem serviços e nos serviços que prestamos aos nossos clientes.

Nesse sentido o artigo que hoje vos propomos “Adapting customer experience in the time of coronavirus” da autoria de Rachel Diebner, Elizabeth Silliman, Kelly Ungerman e Maxence Vancauwenberghe, publicado pela McKinsey & Co, Abril de 2020, vem trazer uma excelente sistematização e apresentar linhas de orientação para as experiências que desenhamos, estamos a desenhar ou a pensamos desenvolver quer no presente contexto, quer no futuro próximo, que todos esperamos ocorra no mais curto espaço de tempo.

Mas esses tempos serão, como bem pressentimos, outros “tempos” para os quais nos devemos preparar desde já!

Ramiro Martins

Mobirise

Article #18
15-04-2020

O ecossistema da Vinha e Vinho hoje

Mobirise

José Ramalho Fontes

José Ramalho Fontes é Presidente e Professor na área de Operações, Tecnologia e Inovação da AESE Business School.

O ecossistema da Vinha e do Vinho estará preparado para esta realidade?

Entre os setores estratégicos da economia portuguesa encontram-se tanto os que se referem às start-up digitais, ao software e às empresas de setores industriais de ponta (automóvel, aviação, etc.), como os setores tradicionais que souberam atualizar-se, introduzir conhecimento e encarar a internacionalização como o seu desafio natural e imediato. Neste segundo grupo inserem-se o têxtil e vestuário, o calçado e a agricultura. 

Neste último setor, o ecossistema da Vinha e do Vinho, tem uma posição particular ligada ao Vinho do Porto, com uma reputação mundial alcançada ao longo de quase três séculos, mas também pelo seu peso, cerca de 1% do PIB, e pelo valor das suas exportações, cerca de 800 milhões €, e pela relevância que tem na ocupação do território, capacidade de responder ao desafio climático e valorização complementar do turismo. 

Contudo, nestas últimas duas décadas a Vinha e o Vinho (VeV) começou a apresentar um conjunto concreto de realizações e iniciativas que permitem aspirar a um forte crescimento das exportações, à consecução do valor de 1.000 milhões €, nos dois ou três próximos anos, segundo alguns observadores. 

A AESE, em parceria com a UTAD, Univ. Trás-os-Montes e Alto Douro, a PwC e várias instituições setoriais – INIAV, ADVID – nos últimos dois anos desenvolveu o Projeto CV3*. 

Uma visão global das empresas do setor

O setor da VeV inclui um pequeno conjunto de empresas tradicionais, fortes e multiregionais, maioritariamente ligadas ao Vinho do Porto que, no final do século passado, se organizaram, cresceram por aquisições e se profissionalizaram. A maior é a Sogrape (190 milhões €, de faturação), mas também inclui a Gran Cruz, Symington Family States e Fladgate Partenership, do Vinho do Porto, e o grupo Aliança / Bacalhoa empresas, com vendas acima dos 80 milhões €. E, em paralelo com as empresas de vinhos, o grupo Amorim faturando globalmente 600 milhões, com a produção de rolhas para vinho, representando cerca de 56 % do EBITDA. 

Numa segunda liga de faturações, um grupo mais numeroso e diversificado, também com marcas conhecidas, incluindo empresas como: Aveleda, Carmin, Casa Santos Lima, Casa Ermelinda Freitas, Casa Relvas, Esporão e Grupo Parras, Portugal Ramos e outras empresas do Vinho do Porto. Este grupo tem uma característica relevante que não sobressai comercialmente, porque inclui várias empresas do século XXI que alcançaram, nestas duas décadas, uma dimensão idêntica ou maior que as tradicionais, porque desenvolveram novos modelos de negócio, especializando-se em certas gamas de produtos que as tornaram mais competitivas. 

No Projeto CV3 algumas destas empresas foram objeto de estudos de caso, duas do século XXI - Casa Relvas e Grupo Parras – e a Aveleda, na 5.ª geração. Estas e outras podem apresentar crescimentos muito diferenciados e virem a desempenhar um papel importante no aparecimento de empresas muito maiores, como será também o caso da Casa Santos Lima e da Casa Ermelinda Freitas. 

Uma breve referência ao setor das tradicionais adegas Cooperativas que sofreu profundas alterações, nestas três décadas, em que muitas desapareceram ou reduziram as suas faturações. Pelo contrário, com faturações entre 10 e 25 milhões €, destacam-se entre outras, a de Pegões, várias do Alentejo (Borba, Redondo, Vidigueira, etc.), Vila Real etc. 

Num terceiro grupo, incluem-se centenas de empresas a vender abaixo de 5 milhões €, cerca de 77 % do total, que incluem algumas marcas premium junto com muitas outras de implantação local ou trabalhando fundamentalmente para a grande distribuição. 

Uma característica diferencial do ecossistema da VeV: do lado da oferta

Quando os mais velhos recordam o consumo do vinho até aos anos 70 lembrar-se-ão de vinho engarrafado de qualidade com as suas marcas – Barca Velha, Aliança, Caves Velhas, Caves de S. João, CRF, Dão Terras Altas, Aveleda, Constantino, Mateus, Grão Vasco, Grandjó, Evel e de algumas Adegas Cooperativas, por exemplo –, depois, o vinho de garrafão consumido em casa e, em terceiro plano, o consumido entre trabalhadores, operários e motoristas e servido na taberna. 

Pelo contrário, atualmente todo o vinho produzido é de qualidade e, muitas vezes, tem uma qualidade que não está espelhada no seu baixo preço, particularmente se comparado com outros vinhos internacionais. Como é que se alcançou esta mudança nas duas décadas do final do século XX e se desenvolveram estas novas empresas do século XXI? Simplificando, mas não faltando à verdade das coisas, do lado das empresas são três as principais razões que justificam esta qualidade generalizada que, em paralelo, gera uma grande concorrência no setor. 

Sem ter em atenção a sua ponderação comparativa uma primeira razão, inovadora no panorama da economia portuguesa, é a colaboração do setor universitário e científico com o tecido empresarial. As novas universidades, em sã competição com o Instituto Superior de Agronomia, Trás-os-Montes e Alto Douro e de Évora e as Escolas Superiores Agrárias (dos Institutos Politécnicos) nestas décadas foram oferecendo, às empresas existentes, enólogos e outros técnicos que puderam transformar o conhecimento tradicional, tácito, em conhecimento explícito e em bons produtos muitos deles blend, na boa tradição portuguesa, com características muito apelativas e variadas, e com eficiência e melhorando o processo comercial. 

Os programas europeus de financiamento à agricultura, pelo seu lado, introduziram no tecido do ecossistema da VeV o capital que era imprescindível para iniciar a reconstrução das vinhas e adquirir a tecnologia, por um lado, e atrair o investimento privado que estava hesitante, por outro. Pela sua dimensão é necessário destacar o Vitis, que se mantém ativo e tem permitido novas e modernas plantações, por exemplo no Alentejo, Tejo e Lisboa, e replantações sistemáticas como aconteceu no Douro e na região dos Vinhos Verdes e, em geral, em Portugal. 

Finalmente, estas contribuições não teriam sido eficazes se não existisse uma nova geração de dirigentes e gestores nas empresas tradicionais, maioritariamente familiares, que desenvolveram relações diretas com as grandes superfícies, exportações mais dirigidas e ponderadas e, sobretudo, sistemas de contabilidade financeira que tinham em atenção o robustecimento dos balanços, nos casos de maior sucesso. Também foram aparecendo novas empresas impulsionadas por empresários muito qualificados que começaram do zero ou relançaram empresas adormecidas, as tais empresas do século XXI, que vão protagonizar o esperado movimento de fusões e aquisições, que já está em curso de forma pontual: a Symington, saiu do Douro e comprou no Alentejo e o Esporão, Alentejo e Douro, comprou no Vinho Verde; a Casa Ermelinda, Setúbal, comprou no Douro e no Verde; Aveleda, Verdes e Casa Santos Lima, Lisboa, compraram no Algarve, etc. 

O lado da procura do ecossistema da VeV

No entanto, há uma outra realidade que se entrelaça com esta numa relação de amor-ódio: a distribuição moderna, as grandes superfícies, que colocaram o vinho como uma categoria de geração de tráfego e que passaram a necessitar de cada vez mais produto e representam cerca de 67% do mercado nacional do VeV. Sendo esta nova procura totalmente dependente das suas estratégias e políticas comerciais puderam impor aos produtores os seus preços e esquemas de promoção, os quais não tinham condições para contrapor preços, a não ser em pouquíssimos casos e à contre coeur. Os dados Nielsen, que não representam todo o mercado, referem que em 2019 se venderam cerca de 340 M€ (garrafas, 274,9 M €; bag in box e tetrapak 67,1 M €) 

Como é que o ecossistema está a reagir às circunstâncias atuais: a procura

Uma primeira consideração é que os primeiros meses do ano foram positivos tanto no mercado interno como nas exportações por várias razões às quais não é alheio o Brexit, porque os importadores do Reino Unido aumentaram os seus stocks e, em geral, as tendências eram positivas nos múltiplos mercados, segundo informações da ViniPortugal. Logo que começaram as preocupações com o potencial confinamento, as vendas nos supermercados também cresceram de forma anormal para se prepararem, em cada um desses mercados, conduzindo globalmente a um Q1 favorável. 

Agora que o turismo parou, os restaurantes bares e hotéis fecharam, o consumo desceu abruptamente e o consumo dos lares confinados não tem volume que compense a quebra. Alguns observadores consideram que as empresas sólidas poderão ter descidas anuais variando entre 20 e 40 % e preocupar-se-ão apenas com diminuições de 50 %. Pelo contrário, aquelas pequenas empresas vão ter muitas dificuldades e espera-se que haja uma certa razia nas que estavam com stocks altos e muito dependentes das promoções dos supermercados e o Ministério da Agricultura foi mesmo já confrontado com a eventualidade de uma destilação de crise. Este quadro de crise pode vir a constituir um novo argumento para a concentração, para aquisições e fusões, e refira-se com certa pena, para um ecossistema mais robusto e competitivo no médio prazo, mais saudável para usar uma palavra muito presente em toda a sociedade, desejada por muitos e agradecida pela maioria. 

Face ao cenário de confinamento obrigatório e de acordo com as indicações das autoridades de saúde, a Quinta da Aveleda, Esporão, Symington, JMF, etc. encerraram as atividades de Enoturismo, mas começaram ou reforçaram as vendas eletrónicas com entregas diretas a partir das suas lojas, com uma dimensão que não seria esperada. Por outro lado, quando as garrafeiras tradicionais esgotaram as suas reservas, outros operadores começaram a oferecer esta mesma distribuição: foi o caso de vários restaurantes da gama superior, assim como um importante grupo hoteleiro, entregando em casa produtos com preços acima de 20 €. 

Assim, espera-se que o comércio eletrónico passe a ser usado de modo mais habitual e que surjam operadores especializados que possam processar de forma eficiente volumes significativos dando oportunidade a pequenas empresas premium escoar os seus produtos de forma competitiva. 

Como é que o ecossistema está a reagir às circunstâncias atuais: os produtores

Do lado da produção uma notícia recente refere que a CVRVV, Comissão Vitícola da Região dos Vinhos Verdes atualizou o maior seguro agrícola do país aumentando a indemnização líquida que passa de 17 para 30 cêntimos por quilograma de uva perdido, e permite ainda que o produtor valorize a sua uva num de vários escalões até um euro por quilograma, o que se traduz em indemnizações mais elevadas em caso de sinistro e beneficia a valorização de mercado. O seu Presidente, Manuel Pinheiro, referiu algo com que muitos outros dirigentes poderiam subscrever: “Estamos a atravessar um momento de grande incerteza em que a agricultura assume um papel de particular importância na gestão futura da nossa economia. Garantir um apoio efetivo e eficaz aos agricultores e, em concreto, aos nossos viticultores é uma prioridade da CVRVV e um garante de maior estabilidade num sector que continua a produzir e que carece de mais incentivos”. 

José Ramalho Fontes


*Sobre o Projeto CV3

A AESE Business School liderou durante os últimos dois anos um projeto destinado a contribuir para a criação de valor no sector da Vinha e do Vinho. Contando com a participação da UTAD, da ADVID, da PwC e o do INIAV, desenvolveram-se eventos, redigiram-se 5 Casos de Estudo de empresas do ecossistema – Casa Relvas, Lavradores de Feitoria, etc. – e lançaram-se algumas linhas de trabalho de investigação, que estão a ser sistematizados. O Projeto envolveu cerca de 500 líderes e dirigentes de empresas que partilharam as boas práticas e as tendências para uma melhor qualificação do setor. 

Tirando partido da experiência da Escola de Negócios utilizou-se a metodologia do estudo de casos (case study), escolhidos estrategicamente, por serem identificadas as boas práticas mais relevantes e, enquadradas no contexto real.


Article #17
14-04-2020

Quatro ideias para além do coronavírus

Mobirise

Pedro Ferro

Pedro Rosa Ferro é Professor na área de Política de Empresa e Diretor do PADE da AESE Business School.

O surto do coronavírus gerou, nas últimas semanas, um ambiente social surreal, se não mesmo apocalíptico, alimentado por uma mediatização paranoica (mesmo tendo em conta a gravidade da situação): «as emoções passaram rapidamente da preocupação geral para o fascínio mórbido, depois para o medo, e a seguir para o pânico genuíno, uma vez que muitas das instituições e modos de vida que tomámos desde há muito tempo como garantidos cederam sob a tensão. O pânico gera o seu próprio contágio emocional e espiritual, que pode sentir-se de modo ainda mais assustador do que o próprio vírus. E o efeito é magnificado pela desertificação dos espaços públicos, que muitos sentem como um esvaziamento do seu eu interior.»[1] Nestas linhas, gostaria de sugerir brevemente quatro pistas de reflexão (entre muitas outras que poderiam ser também relevantes, sobre as quais outros se pronunciarão) suscitadas por esta pandemia.


A fragilidade humana

Em primeiro lugar, a crise do coronavírus acordou, dolorosamente, a consciência da nossa fragilidade – a precariedade e indigência humanas – que tendemos a olvidar em tempos de prosperidade, iludidos por falsas seguranças. Subitamente, inexoravelmente, e por razões que ainda não percebemos inteiramente, milhares de pessoas tremem, sofrem, desesperam e morrem (frequentemente sozinhas), ante a impotência da política, da economia, da tecnologia e da medicina, do progresso e da ciência. A dura verdade é que a ciência não pode mudar, recriar, programar ou controlar o mundo e os homens que o habitam. O máximo que podemos (e devemos) fazer é «dominar a terra» no sentido bíblico de a «cultivar e também guardar», como diz o Livro do Génesis. Nesta linha, é certo que tudo seria muito pior (como aconteceu tragicamente nas pandemias do passado) se não contássemos com os recursos da modernidade, por cujos enormes benefícios no alívio das aflições humanas devemos estar gratos, e que não queremos dispensar. Mas isso é fraco consolo para os que, recorrentemente, veem as suas vidas truncadas «antes de tempo» e para aqueles que os amam. A questão é que a ciência e o progresso – quando animados pela autossuficiência e soberba fáustica ínsitas no «projecto moderno» – não conseguem fornecer o que prometem: segurança, salvação, imunidade ao sofrimento e o paraíso terrestre. Paradoxalmente, a miragem dessa falsa promessa intensifica o padecimento pelas perdas que permanecem e sempre subsistirão[2], e para as quais a visão moderna do mundo não oferece (nem pode oferecer) resposta ou conforto. A ciência e o progresso podem minimizar o sofrimento humano, mas não dão razões, nem sentido, para o enfrentar e suportar, quando é inevitável. A meu ver, só a fé num Deus bom e verdadeiro o pode fazer, sem alienação.


O medo de morrer

Isto conduz-nos ao segundo ponto. A crise do coronavírus trouxe à superfície um imenso medo da morte (a que não sou alheio). A pressa e o zelo com que tantas pessoas fugiram das ruas e do seu local de trabalho e se trancaram em casa – muito mais cedo e mais severamente do que as autoridades preconizaram –, e o modo como viralizaram o seu pânico, revelam o nosso pavor ante a perspectiva da mortalidade e da finitude. Não sei se hoje tememos a morte mais do que em épocas pretéritas, mas não há dúvida de que o nosso tempo lida mal com essa perspectiva e que não se sente preparado para ela. Talvez porque um grande número de pessoas – descrendo ou desesperando da vida eterna – se agarra a esta vida como se não houvesse outra, e ignora que estamos «nas mãos de Deus». Como é natural, a resposta à pandemia está exclusivamente focada na minoração do contágio e no tratamento a doença. Mas isso não resolve a mortalidade dos que morrem nem proporciona meios para morrer bem (algo muito diferente, e até oposto, da eutanásia), o que, até há umas dezenas de anos, estava associado a viver bem. Tampouco acalma a ansiedade dos outros: mesmo adoptando todas as regras da prudência (coisa que devemos fazer), é impossível esconjurar completamente o perigo. A este respeito, a modernidade secular mantém-se silenciosa, porque – pelo caminho, absolutamente centrada no alívio das carências materiais – marginalizou as grandes questões da condição humana: porque estamos aqui na terra? Qual o sentido da minha vida? O acontece depois de morrer?[3]

Este mundo não é para velhos?

A morbidade do coronavírus afecta sobretudo as pessoas mais idosas e frágeis, quer por efeito de «selecção natural» – na medida em que sobrevivem os mais novos, fortes e adaptáveis – quer através de processos de triagem e «discriminação positiva» no tratamento hospitalar, a favor das vítimas mais jovens e produtivas (e com maior probabilidade de cura e esperança de vida), quando o pessoal e os equipamentos necessários não chegam para atender a todos. Isso parece estar a acontecer em Itália e prevê-se que venha a verificar-se noutros países. Aliás, esse procedimento tende a converter-se numa «boa prática» no contexto de escassez de recursos dos sistemas de saúde ocidentais, face ao inverno demográfico. Não ignoro que esta questão é problemática – trata-se de decidir quem vive e quem morre, escolhendo entre a vida de um ou de outro –, até porque tem sido amplamente discutida e não tem solução fácil. Admito que em tempos de emergência possa haver padrões de priorização – para além da ordem de chegada – reflectindo critérios médicos e éticos, bem como preocupações de tipo económico e social. Gostaria apenas de salientar que essa tendência apresenta um desafio civilizacional enorme e pode mesmo constituir uma funesta herança desta crise. Há algumas semanas, um jornalista do Daily Telegraph registou candidamente que «sob uma perspectiva económica totalmente desinteressada, a COVID-19 pode até mostrar-se levemente benéfico a longo prazo, ao abater desproporcionalmente os idosos dependentes»[4]. Por este caminho e com esta lógica, «por quanto mais tempo será socialmente aceitável suportar o direito das pessoas mais velhas a viver os anos que Deus lhes der, e a beneficiar dos cuidados médicos que a sociedade lhes oferece como parte integrante do contrato social»[5]? Por outras palavras, até quando serão os mais velhos – os nossos pais e avós, ou nós mesmos – considerados cidadãos iguais aos outros, com os mesmos direitos de cidadania? Entretanto, dispensamo-los, escondemo-los da nossa vista – remetendo-os para os «lares» (embora saiba perfeitamente que muitas vezes não há, humanamente, melhor alternativa) –, e desviamos o nosso olhar da sua fragilidade e, no mesmo passo, da sua e da nossa própria humanidade.[6] A sua própria existência e presença tende a ser vista como um empecilho do qual convém desfazer-se. E assim, «a vida que requereria mais acolhimento, amor e cuidado, é reputada de inútil ou considerada como um peso intolerável e, consequentemente, rejeitada sob múltiplas formas»[7]. Ora, isto corresponde a uma deriva sinistra. A atitude da sociedade face à vulnerabilidade e finitude humanas manifesta e sinaliza em que medida veneramos (ou não) a igual dignidade humana (independentemente do vigor ou produtividade da pessoa) e faz prova (ou não) dos laços que unem a nossa humanidade comum.

Ver o essencial

Contudo, e para terminar, talvez a irrupção desta pandemia possa contribuir para recentrar as nossas vidas em torno do que é mais importante e significativo. É um lugar-comum dizer-se que as «crises são oportunidades», que a «adversidade nos torna mais fortes» (se não sucumbirmos entretanto…), que «os tempos de perigo são momentos de verdade, em que se prova quem somos», e que «nada será como dantes», etc. Descontando a banalidade – que não é necessariamente falsidade –, a presente situação pode mesmo constituir um abalo salutar. Reparemos num facto óbvio: de um dia para o outro, literalmente, preocupações ingentes, compromissos inadiáveis e tarefas urgentes apagaram-se da nossa agenda ou foram canceladas; a nossa ordem de prioridades alterou-se completamente e foi substituída por outra. Talvez isso sugira que há valores que podemos reordenar na nossa vida (quando regressarmos à normalidade) para que ela seja mais plena; que havia nela coisas a mais e coisas a menos; que a algumas demos demasiado relevo, reconhecendo agora que não valiam tanto a pena ou eram mesmo supérfluas; e, inversamente, que devemos reforçar o investimento diligente em bens mais valiosos: a nossa relação com Deus, a família, a amizade e o serviço aos outros, o trabalho (seja ele qual for), a sabedoria e a liberdade, a alegria e gratidão pelos dons da criação. É sabido que a algumas dessas dádivas só damos verdadeiro valor quando (como agora) nos vemos privados delas. Quando o coronavírus passar – daqui a não sabemos quanto tempo – saboreá-las-emos com um prazer diferente: circular livremente, sem receio da polícia nem medo do contágio (e sem ser preciso passear animais de companhia» ou fazer jogging); respirar sem máscara e a plenos pulmões; jogar, brincar e dançar; encontrar-se, beber café e conversar face a face; cantar e rezar juntos; aventurar a intimidade, apertar a mão, abraçar e beijar. E, nessa altura, estaremos também mais disponíveis para a compaixão e solicitude perante aqueles que – por razões de pobreza, doença, solidão ou ancianidade – não precisaram do coronavírus para estar excluídos da fruição desses bens tão preciosos.

Pedro Rosa Ferro

Artigo publicado no Observatório Almedina

[1] Cf. Nathan Schlueter, «Leisure in a Time of Coronavirus», in The Public Discourse, 18 de Março de 2020.

[2] Ibidem.

[3] Cf. L. S. Dugdale, «The Cure for What Ails Us», in First Things, 20 de Março de 2020.

[4] Cf. Jeremy Warner, «Does the Fed know something the rest of us do not with its panicked interest rate cut?», in Daily Telegraph, 3 de Março de 2020.

[5] Cf. John Waters, «COVID-19 and the New Death Calculus», in First Things, 18 de Março de 2020.

[6] Idem.

[7] Cf. João Paulo II, Evangelium Vitae,n.º 12.


Article #16
13-04-2020

Liderar em tempos de incerteza (II)

Mobirise

Eduardo Pereira

Eduardo Pereira é Coach e Professor na área de Fator Humano na Organização da AESE Business School.

Alguns ainda se lembrarão de Eric McNulty que, no Encontro de Alumni da AESE em 2016, nos sugeria três valores fundamentais - Capacidade adaptativa, resiliência e confiança – para se fazer face a um crescente contexto VUCA (acrónimo em inglês para volatilidade, incerteza, complexidade e ambiguidade).

Pois se nessa altura, e ainda com memórias frescas da crise financeira de 2008, parecia fazer sentido que nos preparássemos para volatilidade e para incerteza, nestes tempos que estamos a viver, adotar estas abordagens torna-se absolutamente fundamental, e evidente. 

O Professor do IESE, Conor Neill, também aponta nesse sentido quando acrescenta o adjetivo “great” ao fator incerteza, no título da sua live session “How to Lead in Times of Great Uncertainty”, que aqui recomendamos no “An article a day”. 

Nestes tempos de grande incerteza, como continuar a liderar bem e a tomar boas decisões?  

Nestes tempos, mesmo aqueles de nós mais equilibrados, racionais e sensatos não estarão imunes a sentirem, em algum momento, que a sanidade mental se lhes escapa. Sobretudo quando estão sob pressão para tomar decisões rapidamente, e que vão no sentido de reduzir, ou destruir, aquilo que se construiu ao longo de anos. 

Nestes tempos, mesmo aqueles de nós mais positivos, gratos e energéticos, não estão imunes a acordarem algum dia sem vontade para serem a “voz positiva na sala”, ou sem energia para serem uma “luz da esperança” para os outros, ou sem razões aparentes para a gratidão.

Como fazer nesses dias?  

Aqueles que já tiveram o privilégio de participar na sessão do caso “A Odisseia no Endurance”, poderão recordá-la com nostalgia, pois Conor Neill traz-nos uma breve história com os exploradores Scott e Amundsen, contemporâneos e concorrentes de Ernest Shackleton

Essa história, que opto por não revelar aqui, serve de mote para nos fazer considerar três hábitos diários, que nos podem ajudar, particularmente nestes tempos. 

Para melhorar a nossa comunicação, para comunicar com impacto, e de forma a que cheguemos aos outros: Praticar, praticar exaustivamente. Usar a quarentena para exercitarmos as nossas competências de comunicação, por exemplo filmando uns minutos por dia o nosso discurso. 

Para não deixarmos que as emoções nos capturem, para dominarmos os nossos pensamentos, mesmo quando sentimos medo, ou incerteza, ou raiva, ou pressão: Escrever, tomar notas, capturar esses momentos no papel. Todos os dias escrever algo na nossa agenda ou diário.

Para aqueles dias mais difíceis, um hábito algo contraintuitivo: Começar o dia devagar. Refletir, nos primeiros momentos do dia, até “ouvirmos” resposta às perguntas “No final do dia de hoje, sobre o que é que eu quero estar agradecido? O dia de hoje é sobre quê? O dia de hoje é para quê?”

Poderemos ampliar esta questão: Os nossos dias, estes tempos, servem para quê?


Article #15
08-04-2020

Liderar em tempos de incerteza

Mobirise

Fátima Carioca

Fátima Carioca é Dean da AESE e Professora na área de Fator Humano na Organização.

Não há muitas semanas atrás, era normal debater a necessidade das organizações evoluírem, procurando criar equipas e ambientes colaborativos, uma cultura de inovação e criatividade e abertura para acomodar soluções de flexibilidade, como forma, sobretudo, de se adaptarem às novas gerações de talento. Porém em muitas empresas, entre o debater e o implementar levantava-se uma barreira feita de tempo, interrogações, medos, riscos que eram difíceis de ultrapassar. Ora, a verdade é que, neste momento, olhamos à volta e, num ápice, muitas das empresas – diria mesmo a maioria - foi forçada a dar este passo.

A situação atual forçou muitas organizações a ajustar, rapidamente, a sua maneira de trabalhar, repensar as prioridades e reavaliar a estratégia e os planos de curto e longo prazo. Mas, para além de tudo isto, estão as pessoas e uma questão vem ao de cima: como podem os líderes motivar e mobilizar as suas equipas para objetivos comuns quando o futuro é incerto e se vive um clima de ansiedade?

Nesta sessão online, Anneloes Raes partilha a sua visão sobre estes desafios e adianta um conjunto de ideias orientadoras muito oportunas, arrumadas num modelo que, de forma significativa, apelidou de CARE. Digo significativa, porque, em tempo de crise como a atual, cuidar das suas pessoas será certamente uma das prioridades de qualquer líder. O que todos esperam de cada líder é que esteja próximo, os apoie, comunique, se preocupe com a sua saúde e bem-estar e, mesmo quando os ajustamentos laborais são imprescindíveis, o faça tendo em consideração critérios de sustentabilidade do negócio e da empresa, mas também critérios de humanidade dada a responsabilidade que tem ante os seus colaboradores e as suas famílias.

Neste modelo, Anneloes Raes elabora 4 recomendações aos líderes: 1) gerir as emoções, 2) atuar e aprender no sentido de, de forma ágil, desenvolver as atitudes adequadas à nova situação, 3) liderar mas confiar nas suas equipas, apoiando-as e sabendo que elas o apoiam e 4) olhar o futuro, criando cenários e, de forma aberta e transparente, partilhar a sua visão sobre o que está a acontecer à organização. Porventura não será a receita completa, mas são seguramente ingredientes indispensáveis para liderar em tempos de incerteza como o que vivemos.

Vale a pena ouvir e transpor para a vida,


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Article #14
07-04-2020

No fim, quem paga a crise?

Mobirise

Bruno Proença

Professor convidado de Política de Empresa na AESE Business School

Este artigo descreve as ligações entre a crise de saúde pública derivada da pandemia Covid-19 e a forte crise económica que está a formar-se e explica as várias medidas que já foram adotadas pelos bancos centrais e pelos governos. Porém, há dúvidas se estas medidas são suficientes para debelarem estas crises que já são históricas pela sua anormal dimensão. E há ainda uma questão por responder: no final, quem mais sofrerá com a crise?


1. Vivemos uma crise terrível e devastadora. Na verdade, são duas crises, duas faces de uma moeda má e negra – como a peste. Por um lado, a pandemia do Covid-19 é a maior crise mundial de saúde pública desde a gripe espanhola em 1918. Por outro lado, a crise económica, que se está a formar, poderá igualar os efeitos da II Guerra Mundial. Qual das crises atacamos primeiro? Sem dúvida que a pandemia do Covid-19 (e com todas as nossas forças). Como diz o adágio popular, “temos que salvar vidas, custe o que custar”.

O problema está aqui: será o custo demasiado alto? Abusando dos adágios populares: “quem não morre da doença, pode morrer da cura”? As medidas adotadas para combater a pandemia vão ter um custo insuportável para a nossa economia, destruindo capacidade produtiva, emprego e lançando uma fatia larga da população no desemprego e na pobreza? 

Nas sociedades ocidentais, construídas em cima da matriz judaico-cristã, o valor da vida é sagrado. Portanto, salvar uma vida nunca é demasiado caro. A vida não tem preço. Porém, também seremos irresponsáveis se negligenciarmos os efeitos da hecatombe económica. Estas crises são gémeas-siameses. Da mesma forma que estão entrelaçadas, também têm que ser atacadas em simultâneo. 


2. O FMI já avisou: esta crise económica vai ser pior do que a que resultou dos profundos problemas financeiros de 2008. Na sexta-feira (3 de abril de 2020), o influente Financial Times publicou na sua capa um gráfico que ficará para a história: numa única semana, 6,6 milhões de norte-americanos pediram apoio para o desemprego, duplicando face aos 3,3 milhões da semana anterior. Desde que há registos, nunca se viu um fenómeno com esta gravidade. 

Ainda ninguém consegue adivinhar a dimensão total desta crise económica mas os primeiros dados antecipam uma devastação sem precedentes. Para a economia nacional, o Banco de Portugal prevê, para já, uma contração do PIB que pode ser de quase 6% em 2020 (num cenário adverso) e a taxa de desemprego a saltar para os dois dígitos. As últimas projeções para as principais economias mundiais avançam valores semelhantes, havendo mesmo quem arrisque quebras no PIB na ordem dos 20%. Não tenhamos dúvidas, se este nível de destruição económica se confirmar, uma parte importante da população nacional e mundial vai ser empurrada para a pobreza, cavando-se ainda mais o fosso que já existe entre ricos e pobres.   


3. Porque é que esta crise económica é tão profunda? As medidas – muito acertadas – de combate à pandemia, adotadas pelas autoridades na esmagadora maioria dos países, provocaram um fenómeno económico raro – uma crise simultânea do lado da oferta e da procura. (A maioria das disrupções económicas nasce de um lado da economia) 

Como todos nós – e bem – temos que ficar em casa para evitar a propagação do vírus, a economia foi colocada no congelador. Por outras palavras, hibernou. E ninguém sabe por quanto tempo. Porém, uma economia parada não produz, não cria emprego e riqueza. Do lado da procura, as pessoas em casa não consomem e não há investimentos. Do lado da oferta, com as empresas fechadas por ordem das autoridades, não há produção, não há vendas, não há exportações. Resultado disto, as empresas não faturam e portanto abrem falência e empurram os trabalhadores para o desemprego. 

A gravidade desta crise é que se auto-alimenta. Quanto mais tempo a economia está em hibernação, mais graves são os efeitos. Infelizmente, quando descongelarmos o sistema produtivo, a economia não está intacta, estará em muito pior estado. Há empresas que já não vão abrir porque não tiveram músculo financeiro para suportar a paragem; há cadeias de fornecedores que se perderam; há sectores, como o turismo, que ficaram sem parte dos clientes; e o desemprego agravará as quebras do lado da procura. Se a hibernação da economia se prolongar por demasiado tempo, podemos entrar numa espiral recessiva, caindo no buraco fundo da depressão económica.   


4. Por isto, a maioria das medidas de combate à crise económica que já foram tomadas têm como objetivo proteger a capacidade produtiva. Por outras palavras, pretendem que, depois de terminadas as medidas de emergência que obrigam ao confinamento em casa, tudo volte à normalidade o mais rapidamente possível. Na terminologia dos economistas, teríamos uma crise em “V”, com uma quebra abrupta no segundo trimestre de 2020 procedida de uma recuperação rápida no segundo semestre do ano e em 2021. 

Para isto, é importante minimizar o número de empresas que vão à falência durante o período de hibernação da economia. É necessário não esquecer que, embora a economia esteja parada e sem produção, as empresas têm custos fixos como, por exemplo, os salários dos trabalhadores, as rendas das instalações, impostos e contribuições para a Segurança Social e custos com os créditos que fizeram no passado. Porém, dada a dimensão do lockdown, isto é mais fácil de dizer do que de fazer. 


5. Repetindo o que aconteceu na crise de 2008, os bancos centrais foram os primeiros a ter uma atuação rápida, minimamente coordenada e eficiente, conseguindo colocar gelo nos mercados, nomeadamente de dívida pública, que se mostravam efervescentes perante os primeiros sinais agudos de crise económica. Mesmo o BCE, que teve uma partida em falso, recuperou rapidamente e voltou a mostrar a sua capacidade de atuação. Os bancos centrais tiveram, para já, quatro tipos de medidas no âmbito da política monetária e da supervisão: 

a. Linhas de crédito a juros negativos para os bancos. No fundo, estão a pagar aos bancos comerciais para emprestarem às empresas e aos particulares. Isto é importante para garantir que há liquidez (dinheiro) para que a economia continue a funcionar minimamente, apesar do estado de hibernação. 

b. Forte intervenção nos mercados de dívida pública (por exemplo, o BCE anunciou um pacote de compras de 750 mil milhões de euros que somou a outros dois de 120 e 20 mil milhões de euros). Este tipo de intervenção tem vários objetivos. Primeiro, evitar a desfragmentação e disfuncionamento deste tipo de mercados com todas as consequências negativas que conhecemos desde a crise de 2011 em Portugal e na Grécia. Segundo, controlar a taxa de juro associada à dívida pública dos países, permitindo que os Estados continuem a financiar as suas políticas de combate à crise da pandemia nos mercados a custos controlados e geríveis. Isto é particularmente relevante para países como Portugal e Itália, que entram nesta crise brutal com níveis elevados de dívida pública. Terceiro, a estabilidade do preço dos títulos de dívida pública interessa aos bancos centrais pois muitas destas obrigações são usadas como colateral pelos bancos comerciais para levantarem as linhas de créditos junto do banco central.    

c. Alguns bancos centrais, como a Reserva Federal dos EUA, baixaram a taxa de juro de referência para 0%. Neste período de baixas taxas de juro, que todos conhecemos desde a última crise, esta medida é mais simbólica do que efetiva. No fundo, pretende mostrar aos agentes económicos que os bancos centrais estão dispostos a fazer tudo o que está ao seu alcance para combater a crise económica. 

d. Os supervisores também suavizaram temporariamente os requisitos prudenciais dos bancos. Vão permitir que os bancos operem temporariamente sem cumprirem as suas obrigações ao nível de rácios de solvabilidade e de liquidez. 


6. Além destas ações, a Reserva Federal dos Estados Unidos adotou outras medidas mais abrangentes, tendo em consideração que tem um mandato mais alargado do que o BCE. A Reserva Federal tem estado particularmente ativa no mercado cambial garantindo que não faltam dólares, a principal divisa do comércio internacional. Com o lockdown generalizado na economia mundial, os países deixaram de exportar e logo deixaram de receber os dólares necessários para pagar as importações. Perante isto, começaram a vender ativos em dólares para conseguirem divisas, o que provocou uma pressão anormal neste mercado. Isto obrigou a Reserva Federal a intervir em concertação com outros bancos centrais para garantir a liquidez de dólares, evitando problemas ainda mais graves no comércio internacional. 

7. Não há dúvidas que os bancos centrais têm estado ativos no combate à crise económica. Para muitos economistas, largaram a sua “bazuca”. Infelizmente, toda esta ação do lado da política monetária é insuficiente para resolver uma hecatombe com esta dimensão. Os bancos centrais acalmaram os mercados. No fundo, compraram tempo. Mas para resolver esta crise económica é necessária uma ação concertada com as autoridades políticas. É necessária política orçamental. E os governos têm estado a atuar, lançando medidas sucessivas com o objetivo de salvaguardarem a capacidade produtiva. 


8. O FMI fez um bom resumo das medidas adotas pelos diferentes países. No caso português, o Governo anunciou um pacote com cinco dimensões:  

a. Linhas de crédito com garantia estatal, operadas pelos bancos, para os sectores atingidos no valor de três mil milhões de euros (1,4% do PIB); 

b. Adiamentos dos pagamentos de impostos (5,2 mil milhões de euros, 2,5% do PIB) e à Segurança Social (mil milhões, 0,5% do PIB) por parte de empresas e trabalhadores; 

c. Sistema de lay-off simplificado, com o Estado a suportar parte dos salários dos trabalhadores, e apoios para quem está de quarentena ou foi obrigado a ficar em casa em suporte à família; 

d. Reforço e transferências de verbas para o Serviço Nacional de Saúde e regras mais fáceis de procurement. 

e. Moratória para empresas e famílias nos seus créditos junto do sistema financeiro. 


9. Todas estas medidas vão no sentido certo. Como referido antes, pretendem aliviar os custos que as empresas têm, mesmo quando estão paradas, com os trabalhadores, com os impostos e contribuições e com os créditos junto da banca. Além disto, permitem que as empresas acedam a crédito para fazer face a outros custos enquanto não faturam por estarem sem atividade devido ao confinamento a que todos estamos obrigados. No fundo, estas medidas pretendem garantir a sobrevivência das empresas enquanto a economia está em hibernação, evitando a destruição de capacidade produtiva. A dúvida que muitos economistas colocam é se são suficientes perante a hecatombe económica que muitos antecipam.   

10. Estes pacotes de medidas vão ter um impacto significativo no défice orçamental e na dívida pública. Há estimativas que apontam para, em média, saltos entre 10 a 20 pontos percentuais na dívida pública dos países da União Europeia. O problema é que nem todos partem do mesmo ponto. Portugal e Itália, por exemplo, têm níveis elevados de dívida pública, o que é uma condicionante séria para a dimensão da política orçamental que pode ser dedicada ao combate dos efeitos da pandemia. Agravamentos acentuados de dívida pública são um peso que atrasará a recuperação económica no futuro e podem colocar os países sob o olhar desconfiado dos investidores, tal como aconteceu na crise das dívidas soberanas. 

11. Por isso, é tão pertinente a pergunta: quem paga a crise? Os governos dos países do sul da Europa têm defendido a mutualização da dívida que resulta das medidas contra a pandemia, num mecanismo de solidariedade europeia. Afinal, ao contrário da crise de 2008, esta não resulta da ação particular de qualquer país e atinge todos. Como dizem os economistas, é uma crise de origem simétrica e não há questões de moral hazard. Porém, os países do norte da Europa têm resistido. Portanto, para já, somos todos nós que vamos pagar a crise. Com a dor de quem, infelizmente, está doente, com o sofrimento da separação das pessoas de quem mais gostamos, com a subida, esperemos que temporária, do desemprego e da pobreza e com os nossos impostos no futuro. Mas é necessário resistir e, de imediato, atacar as duas crises em simultâneo.


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Article #13
06-04-2020

O mundo vive um momento sem precedentes

Mobirise

Salim Giva

Administrador Cofundador da VILT | 45º PADE 

Nenhuma nação, empresa ou família estava preparada para o cenário que o vírus Sars-CoV-2 veio trazer. Hábitos profissionais e pessoais alterados, empresas a funcionar de forma deslocalizada, as nossas casas a juntarem num só teto, e de forma simultânea escolas, empresas ou instituições. Uma nova forma de viver que fomos obrigados a aceitar e a implementar em tempo record para sobreviver à COVID-19.

Pela primeira vez todos somos chamados a participar ativamente na não-propagação do vírus, todos somos responsáveis por fazer algo. Subitamente planos com mais de uma semana tornam-se muito longos, a ordem é para viver um dia de cada vez.

Muitos de nós já ouvimos os vários cenários macroeconómicos que os analistas todos os dias apresentam, mas quantos de nós já pensámos nos microeconómicos?

Segundo os dados da PORDATA, Portugal tem mais de 1,295 milhões de empresas. Dessas mais de 1,294 são PME’s. Quantos de nós não conhecemos as microempresas familiares que sustentam uma casa e os estudos dos filhos. Quantos de nós não conhecemos o pequeno restaurante de bairro que tem o marido a servir às mesas e a mulher na cozinha? Ou a frutaria que tem o marido a arrumar as caixas enquanto a mulher atende os clientes? Ou a papelaria, o café ou o barbeiro? Estes são aqueles que mais sofrem no contexto atual. Aqueles cuja sobrevivência depende diretamente dos seus negócios, aqueles que não querem saber se esta é uma crise económica em V ou como reagiram as bolsas às medidas anunciadas pelos bancos centrais. Aqueles cujos negócios não se adaptam ao teletrabalho. Aqueles que não dormem desesperados sem saber o que fazer. Aqueles que, regra geral, não têm a formação nem a informação necessária para saber o que fazer, num contexto como o que hoje vivemos.

Todos podemos fazer algo por estes empresários, por estes lutadores incansáveis que trabalharam uma vida para montar os seus negócios. Todos podemos, com pequenos gestos, seja um telefonema a dar uma informação preciosa ou dicas de como reinventar os seus negócios, fazer a diferença na sobrevivência destas empresas. Porque não começar já hoje?

Eis alguns conselhos que podemos dar ou ajudar a implementar:

Cash flow: os próximos 2 ou 3 meses podem ser muito difíceis a nível de entrada de receita. Fazer um mapa simples, com os saldos que existem em caixa e as despesas fixas mensais pode alertar para algum gasto que pode ser evitado ou reduzido. Dará uma perspetiva realista sobre quanto tempo poderá aguentar a empresa;

Parceiros: falar com os clientes, fornecedores, senhorios e outros parceiros de negócio. Apresentar as dificuldades e saber ouvir as dificuldades dos terceiros pode ajudar a encontrar soluções equilibradas. Neste momento todos estão disponíveis para ajudar e negociar prazos de recebimento e pagamento, avenças mensais, rendas. É nos momentos de dificuldade que se estreitam as parcerias e aqueles que se entreajudarem neste momento serão os parceiros preferenciais no futuro;

Colaboradores: trazer os colaboradores para o centro de decisão. Partilhar com eles as dificuldades e as medidas planeadas. Torná-los parceiros neste momento é fundamental. Na verdade, esta crise não tem culpados e não-culpados. Todos estão do mesmo lado;

Aconselhamento: são várias as linhas de crédito disponíveis para os empresários, com condições mais favoráveis para os micro e pequenos. É fundamental o aconselhamento certo sobre qual a melhor linha de apoio que ajude o empresário nesta situação. É muito importante fazer a certificação da empresa junto do IAPMEI para apurar a sua dimensão;

União: é importante falar com os outros pequenos empresários do mesmo sector ou da mesma zona. Juntar-se a alguma associação do sector. Partilhar informações ou discutir soluções com os que outrora eram concorrentes. Implementar medidas conjuntas e com partilha de custos pode ser uma saída. Ninguém vai sair a ganhar desta crise, mas trabalhando juntos talvez todos possam perder menos;

Reinventar o negócio: estudar quais as formas alternativas que existem para estar próximo dos clientes. Mudar para take-away, implementar formas de delivery ou entrar nos marketplaces online, pode abrir oportunidades que perdurarão no pós-crise. Tempos de crise são também tempos de oportunidade;

Formação: Aproveitar para entender melhor o negócio, implementar as boas práticas de gestão que são eternamente adiadas. Inúmeras escolas de negócio nacionais e internacionais abriram os seus cursos online nesta fase.

Vamos fazer mais do que ficar em casa. Vamos a partir de casa dar o nosso contributo para a sobrevivência de milhares de empresas e famílias. Vamos contribuir ativamente para relançar a nossa economia que é suportada por estas PME’s. Vamos fazer com que após esta pandemia, o restaurante, a frutaria, a papelaria ou o barbeiro continuem a existir e a servir o seu bairro.

Depende de todos nós! 

Mobirise

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Article #12
03-04-2020

Global recession almost “inevitable”

Mobirise

Nuno Fernandes

Professor of Financial Management of IESE Business School.

IESE's Nuno Fernandes issues new report on economic impact of COVID-19 COVID-19 is likely to send the world into recession, because of its blow to both supply and demand, its global reach and its origin in economic powerhouse China, according to a new report.

“A global recession now seems inevitable,” according to the report Economic Effects of Coronavirus Outbreak (COVID-19) on the World Economy by professor Nuno Fernandes.

The report estimates that gross domestic product (GDP) will take a hit ranging from 3% to 5%, depending on the country, in a mild scenario in which the shutdown lasts for 1.5 months. Every extra month of shutdown accounts for approximately 2-2.5% of global GDP.

Fernandes notes that how deep and long the downturn will be depends on many factors, in addition to the length of current lockdowns. Those include the success of measures to prevent the spread of COVID-19, along with the effects of government policies to alleviate liquidity problems in SMEs, to support families under financial distress, and to secure jobs.

“There is still time for global policymakers to have a coordinated policy response to the virus and its economic impacts,” Fernandes writes. “However, time is running out.”

The severity of the recession will also depend on how companies react and how quickly supply chains can be restored, the report says.

Historical comparisons difficult

In making its GDP forecasts, the report shows why simple historical comparisons with crises such as SARs or the 2008/9 financial meltdown are not applicable.

Unlike with previous crises, Fernandes points out that “this time, we are facing a combined supply and demand shock” exacerbated by a variety of factors, such as the highly integrated nature of the world economy and the key role that China, the center of the initial outbreak, now plays in it.

The global pandemic has also come at a time when interest rates are extremely low, and monetary tools to combat the crisis are limited. “Central banks exhausted their firepower during the good times. There is almost no room for monetary stimulus to help sustain the coming risks,” he warns.

Taking into account this context, the report discusses how the economic impact of the coronavirus outbreak is being felt across different industries and countries. It finds that the economic costs of the crisis will hit some much harder than others. For example:

· Service-oriented economies will be particularly negatively affected, and have more jobs at risk

· Countries like Greece, Portugal, and Spain that are more reliant on tourism (more than 15% of GDP) will be more affected by this crisis

· Countries more reliant on exports will suffer disproportionally

GDP estimates based on three scenarios

The report also attempts a rough estimate of the potential global economic costs of COVID-19 under three different scenarios: a shutdown of 1.5 months (from mid-March to end of April), of 3 months (lasting until mid-June), and of 4.5 months (until end of July.)

In a mild scenario (a shutdown of economic activity is assumed to last 1.5 months, from mid-March to end of April):

· Overall, for all countries analyzed, an average impact of -3.5% of GDP is expected.

· The U.S. is expected to enter into a recession, with a downturn in GDP of 0.8%. Overall, the crisis is expected to cost it nearly 3% of its GDP.

· Most European countries will face significant recessions, seeing contractions of their GDP of 2% to 3%. Judging from prior recessions, a decline in GDP of this magnitude will significantly increase unemployment.

· In this scenario, nearly all countries analyzed will experience negative GDP growth, apart from China (although its growth will still be slashed from a pre-crisis estimate of 6%, to below 3%).

If crisis measures are extended:

· On average, each additional month of shutdowns will cost 2%-2.5% of global GDP.

· If extreme COVID-19-related measures last until mid-June 2020, the U.S. will see its GDP fall almost 4%. Italy and Germany will see their GDP fall close to 6%, and the UK more than 5%.

· If it lasts until the end of July 2020, the average decline in GDP would be close to 8%. And the decrease in GDP could, in some cases, be higher than 10%.

According to Fernandes, “If the ongoing crisis lasts until the end of the summer, the global economy faces the gravest threat seen in the last two centuries.”

This article was published at IESE 

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Article #11
02-04-2020

Coronavirus e supply chain. Lições para o tecido empresarial

Mobirise

Nuno Biga

Professor de Operações da AESE Business School.

A cadeia de fornecimento de qualquer produto ou serviço, independentemente do ramo de atividade económica ou do mercado de atuação, não se encontra verdadeiramente preparada para lidar com situações de natureza pandémica.

Esta vulnerabilidade foi posta em evidência com a rápida propagação do COVID-19, sentindo-se de imediato o seu impacto no funcionamento das organizações. As vantagens competitivas que a globalização da economia potencia podem, muito rapidamente, transformar-se num fator paralisante que importa acautelar. 

A resiliência assume-se assim como uma competência crítica de qualquer empresa, fundamental para a sua sobrevivência, e que importa por isso reforçar. As organizações humanas, como qualquer ser vivo, precisam de “criar imunidades” para sobreviver e prosperar, sendo por isso necessário desenvolver “vacinas” de largo espectro que permitam responder com eficácia a novos desafios. 

Este artigo apresenta uma abordagem sistémica para responder ao COVID-19 e futuros acontecimentos igualmente impactantes, sugerindo às empresas ações concretas a empreender nos vários elos da cadeia de fornecimento. Realça ainda o papel dos governos na criação de condições favoráveis para se enfrentar com êxito este e os próximos desafios que a humanidade é chamada a resolver.

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Article #10
01-04-2020

What Coronavirus could mean for the global economy

Mobirise

André Vilares Morgado

Professor de Política Comercial e Marketing da AESE Business School.

Recentemente, no semanário Expresso, o reputado economista Nouriel Roubini (professor na Stern School of Business da Universidade de Nova York) é peremptório ao afirmar que a pandemia causada pelo novo coronavírus provocará uma crise económica com impacto superior à crise financeira de 2008-2009.

Os mercados de capitais já sinalizaram a catástrofe económica que se avizinha e os agentes económicos aguardam expectantes pela anunciada recessão mundial. Neste cenário, a incerteza com que os empresários e dirigentes são confrontados é muito elevada. Todavia, a melhor forma de lidar com este contexto desafiante reside no conhecimento e na informação.

A prestigiada revista de gestão Harvard Business Review acaba de publicar um interessante e pertinente artigo intitulado “What Coronavirus Could Mean for the Global Economy”. Com base na análise de pandemias anteriores, os seus autores exploram diferentes cenários de recessão económica e sugerem um conjunto de acções que se podem tomar já no curto-prazo.

Recomendo vivamente a sua leitura, uma vez que relembrar o passado ajuda a construir o futuro. Os tempos que se avizinham não se afiguram fáceis mas, perante o desconhecido, devemos adoptar uma postura serena e prudente, evitando tomar decisões de forma precipitada.

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